sábado, 24 de maio de 2025

REFLEXÃO PARA O VI DOMINGO DO TEMPO PASCAL – Jo 14,23-29:

 


Adentramos no sexto domingo do tempo pascal, seguindo com a leitura do testamento de Jesus no Quarto Evangelho, o qual constitui o Seu grande ensinamento sobre o mandamento (dinamismo) do amor, e sobre a entrega da própria vida através do gesto do Lava-pés. A liturgia propõe para a nossa meditação o texto de Jo 14,23-29. 

Antes de tomarmos o texto de hoje, se faz necessário recordar que nos versículos anteriores, Jesus prometeu o Espírito Santo aos discípulos. É o dinamismo de vida do Pai e do Filho, que, doado por ambos comunica vida, filiação e amor. É aquele que garante a continuidade da vida e da presença do Cristo para a comunidade, através da vivência do mandamento do Amor. Isso posto, podemos entrar no horizonte do texto.

Jesus continua seu discurso, dizendo: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada. Quem não me ama, não guarda a minha palavra. E a palavra que escutais não é minha, mas do Pai que me enviou”(vv.23-24). Jesus afirma a importância do amor e de guardá-lo como mandamento/Palavra. O amor é a plena adesão e identificação a Ele. Durante toda a sua vida pública, ministério e Obra, Ele tratou de revelar com gestos, atitudes e palavras a forma deste Amor: é uma conduta de vida, um estilo! É a capacidade de colocar a vida em relação ao outro na dinâmica do oferecimento de si, portanto, um Amor oblativo, que se doa sem esperar nada em troca. É um Amor gerador de vida.

Amar a Jesus é colocar a própria vida em sintonia com a Sua vida. E o critério para saber se o discípulo O ama é o fato de saber se a Sua Palavra é, de fato, guardada, ou seja, vivida. O verbo guardar (hbr. Shama) não significa reter para si, mas observar, no sentido de cumprir/viver. Só o amor pode motivar a adesão à Palavra/mandamento de Jesus. Só o amor tem a capacidade de tornar o discípulo em morada de Jesus e do Pai. Na medida em que este revive e reproduz em sua vida o mesmo sentido de vida do Senhor e guarda a Sua Palavra, se torna lugar através do qual Deus pode habitar e agir.

Jesus, até o momento, já havia entregado boa parte de seu testamento: o gesto profético do Lava-pés, que ilustra a forma radical de seu amor, e o mandamento novo do amor. Agora, para confirmar os discípulos nesta forma de vida, fala uma vez mais daquele que guardará a comunidade e os discípulos nesta missão: “o defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele ensinará tudo e vos recordará tudo o que vos tenho dito” (v.25). Na teologia do Quarto Evangelho, o Espírito é o defensor; tem a função de ensinar e recordar. O termo que João emprega é παράκλητος/paraklétos (gr. Pará = junto de, ao lado de / kalein (kaleo) =  chamar), que significa “estar junto de”, ou “ser chamado para ficar ao lado”. Ao lado do discípulo e da comunidade, enquanto presença ativa e viva do próprio Senhor.

Outras duas funções são apresentadas por Jesus: ensinar e recordar. Ambas as funções querem dizer a mesma coisa: atualizar. Ora, o verbo “recordar”, na fé e tradição do Antigo Testamento remente à atitude da memória bíblica, isto é, tornar presente no hoje o ensinamento, a missão e a vida mesma de Jesus. O ensinar/recordar são duas atitudes imprescindíveis para a vida da comunidade. São as atitudes daqueles e daquelas que vivem a novidade do convite à vida ressuscitada de Jesus, e dela dão testemunho. O Espírito Santo é aquele que inscreve (escreve a partir de dentro) a vida mesma de Jesus em nós. Ele é a letra de Cristo que escreve no livro da vida humana a vida de Jesus.

“Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo. Não se perturbe o vosso coração” (v. 27). Jesus fala da paz, outro dom em promessa que anuncia em seu testamento. É preciso entender que paz é esta. É aquela que, no Antigo Testamento está associada à posse da terra prometida. Mas ela é dom e garantia do tempo do Messias. Significa que a espera acabou e que a promessa foi cumprida.

Todavia, no Novo Testamento, a paz não se dá em virtude da conquista de um lugar geográfico, como a posse da terra da promessa, no AT. Ela se dá através da relação com Jesus. Nesse sentido, Ele é a promessa cumprida. Assim, para os discípulos, a Paz é um modo de ser e de existir. É ela qualidade de vida. Por isso, a paz que Jesus dá é Ele mesmo.

Qual a finalidade de Jo 14, 23-29 para a comunidade dos discípulos, para a geração posterior e para nós, hoje? Fundindo os horizontes da comunidade dos discípulos (tempo narrado, os anos trinta) e o da comunidade joanina (a geração posterior dos fieis, na qual inclui-se todo o fiel-discípulo e leitor do Evangelho, pelos idos dos anos noventa), a intenção do texto atinge seu ápice quando a comunidade cristã lê, assimila e adere ao testamento/ensinamento de Jesus como sendo seu modo de vida, pautando o seu agir e sua identidade no modo de vida Dele. Assim, o discurso de despedida que o Senhor deixa aos seus serve para que eles, e a geração seguinte, possam balizar seu ser, viver e agir na Sua ausência. Nesta perspectiva, a comunidade teria as ferramentas (os meios) para viver constantemente o convite e a realidade de uma vida ressuscitada garantida pelo dom do amor do Senhor e por seu Espírito, isto é, viver segundo o Filho de Deus, gerando Paz e vida.


Pe. Joao Paulo Sillio.

Santuário São Judas Tadeu, Avaré / Arquidiocese de Botucatu-SP.

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