domingo, 26 de novembro de 2023

SOLENIDADE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, REI DO UNIVERSO - Mt 25,

 


A solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, apresenta a conclusão do discurso escatológico de Mateus (Mt 24 – 25), a última catequese que o evangelista reuniu a partir do ensinamento de Jesus, que antecede aos momentos finais da missão pública do mestre, os julgamentos religioso e político e sua morte. Mas para saborear a leitura, meditação e compreensão deste texto, é preciso recuperar seu contexto imediato. Ha três domingos, o Senhor falava dos mistérios do Reino novamente em parábolas. A partir delas refletíamos sobre a ausência de alguém: o dono da casa, que havia saído; o noivo, que tardava em chegar; o patrão, que viajava, deixando seus bens em forma de talentos. E agora, na conclusão deste discurso escatológico, Mateus nos desafia e nos diz: aquele que pensávamos ausente, sempre esteve presente.

 

Não conseguíamos ver a sua gloria porque ele se deixava ver através dos últimos, dos pequenos, dos desprezados e marginalizados; naqueles que tinham fome, sede; não tinham roupa nem terra; inclusive naqueles que estavam presos. Ele sempre esteve presente, mas, ao invés de vermos sua glória, enxergávamos tão somente sua pobreza.

 

A realeza de Jesus, proposta para esta solenidade com a qual se encerra este ciclo litúrgico, se pauta, acima de tudo, pelo serviço, a entrega e a doação de si para aqueles que se encontram na marginalização. O fio condutor da conclusão do ensinamento escatológico, e que funcionará como que um refrão será o dito “todas as vezes que fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes!”. O texto proposto é longo. Por isso deteremos nossa leitura sobre alguns versículos para podermos beber e saborear a sua mensagem.

 

Jesus continua seu ensinamento, ao interno do discurso escatológico, recorrendo a uma imagem muito presente na tradição de Israel contida no Talmud. Ali se lê “Na outra vida, o Santo, que bendito seja, tomará um rolo da Torá, o repousará sobre os joelhos e dirá, ‘os que estiverem trabalhando, venham, pois receberão a sua recompensa’”. Como mestre autorizado, conforme a perspectiva de Mateus, o Senhor muda o conteúdo deste dito da tradição de Israel para mostrar o seguinte aos seus discípulos: aquilo que determinará a vida da pessoa não será a relação que estabeleceu com a Lei, mas a relação que ele estabeleceu com o seu irmão. Não se pode esquecer que, para o evangelista, desde o início de seu evangelho, Jesus é Deus-conosco – Emanuel. Nesse sentido, com Ele, a relação da humanidade não se dirige unicamente à Deus, mas com Deus e como Deus ao homem. O Deus de Jesus não pedirá contas ao homem se este honrou-O com sua fé, mas se foi capaz de amar como Ele.

 

O Jesus de Mateus apresenta-se como o “Filho do Homem” glorificado. Esta personagem bíblica, aparece desde a literatura apocalíptica de Daniel, em Dn 7. É uma figura misteriosa, simbólica, que pode, por um lado aludir à condição humana da personagem em questão. Por outro lado, representa aquele que foi escolhido e investido por Deus para a tarefa de executar o Seu agir na história. É dessa personagem que Jesus se serve também para conceber sua ação e seu ministério.

 

Qual a atitude desta figura escatológica? “Todos os povos da terra serão reunidos diante dele, e ele separará uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos” (v.32). Reunirá todos os povos da terra, separará as ovelhas dos cabritos. Interessante que Mateus se serve da expressão literal “todas as nações pagãs” (πάντα τὰ ἔθνη – panta tá Ethne), para indicar que a imagem do juízo não será aplicado a Israel, mas a todas as nações pagãs, isto é, que não fazem parte do povo israelita. Na perspectiva de Mateus, o povo já recebeu seu juízo ao recusar a ação de Deus em Jesus. A ação deste Filho do Homem será saber separar, como um pastor, as ovelhas dos cabritos (lit. bodes). Sabe separar porque conhece bem aqueles que empenharam sua vida para o bem, daqueles que não assumiram este caminho. As ovelhas são símbolos para os que deram o passo ao discipulado. É importante notar que o julgamento se dá ao interno do rebanho.

 

Qual caminho é este? Jesus elenca seis atitudes, das quais ele é o destinatário, numa primeira análise, e que depois, por ser uma parábola, o termo de comparação se abre para abraçar o faminto, o sedento, o estrangeiro, o nu, o enfermo e prisioneiro. As atitudes que ele descreve como sendo realizadas para ele não estão voltadas para o campo da religiosidade, da observância ritual. Mas para o horizonte das relações humanas; para as necessidades humanas, marcadas pelas situações de sofrimento e exclusão. Na perspectiva de Jesus, o que salva o homem não é um comportamento religioso. Mas um comportamento humano. Na ética que provém do ensinamento do Mestre, não deve haver espaço para o seguinte raciocínio, “faço porque Deus mandou, e, por isso, questão de fé”, mas “faço porque é questão de humanidade”.

 

Analisando e compreendendo as seis atitudes. Dar de comer e de beber significa restituir as necessidades básicas e vitais aos empobrecidos. É recuperar a dignidade humana e o direito de cada um, já assegurados no decálogo, no código da Aliança em Ex 19 – 24. A Lei de Israel já previa também o acolhimento ao estrangeiro, uma vez que o próprio povo vivera dessa maneira no Egito. Receber o estrangeiro, era, ainda, uma forma de se fazer experiência com Deus; a hospitalidade era a oportunidade de acolher o próprio Deus que visitava seu povo. Basta recordar a experiência de Abraão, junto do Carvalho de Mambré (Gn 18,1-15). Deus não quer seu povo reproduzindo em seu meio as mesmas injustiças sofridas. O Senhor, na condição de mestre autorizado inova, supera e provoca, ao incluir mais duas categorias de pessoas que eram absolutamente marginalizadas e excluídas: os enfermos e os encarcerados. Algo impensável para a sociedade daquele tempo.

 

Os enfermos eram, naquele contexto, excluídos da vida social e religiosa, uma vez que a enfermidade, equivocadamente, era concebida como castigo em virtude de algum pecado que a pessoa ou seu parente tivesse cometido. Na perspectiva de Jesus, a visita ao enfermo se torna um gesto de ruptura com esta mentalidade. Significa recuperar a dignidade da pessoa através do cuidado para com ela. O prisioneiro era, naquele ambiente, alguém que não suscitava compaixão ou piedade dos outros. Antes, desprezo. Visitar um prisioneiro exigia também alimentá-lo, uma vez que os carcereiros não executavam essa tarefa.

 

Via de regra, os encarcerados eram aqueles que o Império rotulava como subversivo, perigoso, revolucionário, bandidos. Porém, todas as vezes em que se menciona a categoria dos encarcerados no NT, esta situação de encarceiramento se deve ao Evangelho. Nesse sentido, visitar os prisioneiros seria, da parte dos discípulos do Reino, uma tomada de posição e de atitude. Significava voltar-se contra a ideologia imperial e optar pelo Evangelho.  

 

Depois destas atitudes descritas na narração segue-se o questionamento daqueles que foram contados e separados como justos: “Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer? com sede e te demos de beber? Quando foi que te vimos como estrangeiro e te recebemos em casa, e sem roupa e te vestimos? Quando foi que te vimos doente ou preso, e fomos te visitar?” A resposta do Filho do Homem-Jesus soa reveladora: “Em verdade eu vos digo, que todas as vezes que fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes!” (v.40). O menor, ao interno da parábola, é o que foi colocado como o último, o desprezado, marginalizado e excluído. São todos aqueles que, no tempo de Jesus, não eram contados como pessoas.

 

O outro lado da moeda também é ilustrado pela parábola. “Afastai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno, preparado para o diabo e para os seus anjos” (v.41-46). O adjetivo “maldito” não pode ser entendido como uma sentença de Deus dada ao homem. Deus não amaldiçoa o ser humano. Este dito contido na parábola recorda o fratricídio de Abel, por Caim. Assim, Jesus é muito severo: não oferecer ajuda, não responder às necessidades mais elementares do ser humano, não socorrer o irmão em seus sofrimentos, equivale cometer a mesma falta de Caim. É o mesmo que um homicídio. São considerados malditos pelos pobres e marginalizados. Eles serão os juízes! Em virtude do egoísmo, do fechamento diante das necessidades dos irmãos se tornam malditos.

 

A estas pessoas, Jesus não reprova por terem feito algo mal, mas por não terem empenhado a vida pelo bem do irmão. Tornando-se, inclusive, instrumentos de morte para o próximo.

 

Diante deste belíssimo texto, possamos fazer a revisão de nossa vida e de nossa missão.

 

Pe. João Paulo Sillio.

Santuário São Judas Tadeu, Avaré/Arquidiocese de Botucatu-SP.


sábado, 18 de novembro de 2023

XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM - Mt 25,14-30

 



O evangelho deste trigésimo terceiro domingo do tempo comum continua a leitura e meditação do discurso escatológico presente no evangelho de Mateus. Os capítulos 24 à 25 abarcam a última das cinco catequeses que compõem o evangelho. O catequista bíblico recolheu este ensinamento do Senhor para oferecer as balizas aos discípulos de sua comunidade, a fim de que possam compreender o modo através do qual serão julgados, ou seja, a partir da maneira como tratou, em suas necessidades, os irmãos mais fragilizados; frutificando a vida em boas obras.

Uma vez mais, Jesus se serve do recurso das parábolas para ensinar seus discípulos. Conhecida como “a dos talentos”, ela tem a intenção de ilustrar que a existência humana é o tempo oportuno e definitivo de fazer frutificar os dons recebidos de Deus e, assim, se preparar para o encontro com o Senhor.

A parábola serve-se da realidade de um patrão que antes de sair de viagem confia a três de seus empregados uma soma de dinheiro. Note-se que ele reuniu seus servos e confiou a cada um deles uma parte de seus bens. Ele não oferece, para reaver mais tarde; mas dá com gratuidade. É interessante, ainda, que Jesus mostra uma qualidade deste chefe: ele dá a cada um de acordo com suas capacidades. Ou seja, é alguém que conhece profundamente os seus.   

Os bens de que Jesus se refere são chamados de talentos, uma unidade de medida daquela época. Cada talento equivalia a 34 quilos de Ouro. A um deu cinco talentos de ouro. O primeiro recebeu o equivalente à 170 quilos de ouro. O segundo recebeu dois talentos – 68 quilos de ouro. Por fim, o terceiro recebeu um talento somente. Em seguida, o patrão saiu de viagem.

Os vv.16-17 narram a atitude dos dois primeiros, os quais conseguem lucrar cem por cento. O v.18, por sua vez, relata a atitude do terceiro empregado que se decidiu por enterrar a quantia confiada a ele pelo patrão. Jesus realça o contraste existente entre os dois primeiros e este último: cem por cento contra zero de lucro. A atitude deste terceiro empregado é de se lamentar. O texto grego dá a entender que ele sepultou o talento recebido. E isto é grave. Preferiu sepultar o talento – e não era pouco, pois rendia 34 quilos de ouro – com a vida.

Segundo a parábola, o dia do acerto chegou com a volta do patrão (v.21-23). O primeiro empregado apresentou-se com os seus talentos lucrados. De cinco talentos (170kg), devolveu ao patrão mais cinco (340kg). Foi elogiado pelo patrão, e recebendo a administração de muito mais, foi convidado a tomar parte da alegria do patrão. O segundo apresentou-se com mais dois talentos lucrados, dos dois que havia recebido (136kg); sendo elogiado pelo seu senhor, igualmente recebendo mais para frutificar e participando de sua alegria.

A quem se aplica a imagem dos dois servos que lucraram as somas recebidas? No tempo narrado, ou seja, no horizonte de Jesus e de sua missão, os dois servos são símbolos daqueles que aderiram ao Senhor e suas palavras, se tornaram discípulos e estão labutando no discipulado. Já no horizonte da comunidade de Mateus, os dois que participam do banquete escatológico já não são mais tratados como servos, mas os crentes comprometidos na fidelidade e que frutificaram em boas obras.

Por fim, chegou aquele que havia enterrado a soma de ouro que o patrão lhe concedeu cuidar. Ele veio logo se desculpando: “Senhor, sei que és um homem severo, pois colhes onde não plantaste e ceifas onde não semeaste. Por isso fiquei com medo e escondi o teu talento no chão. Aqui tens o que te pertence” (v.24-25). O patrão indignou-se com a postura do empregado, motivado por covardia, medo e acomodação. A sua postura frente ao terceiro empregado segue descrita pelo Jesus de Mateus, nos vv. 26-30. E será sobre ela que o relato parabólico se deterá.

A personagem do terceiro empregado se aplica a quem? No horizonte da vida e da missão de Jesus, o terceiro servo é metáfora para as autoridades e chefes do povo, que através da atitude de enterrar a soma recebida, estão, na verdade recusando o projeto de Deus realizado por Jesus. A imagem é polissêmica – pode atingir vários significados. São também os discípulos que se amedrontam ou se acomodam em suas zonas de conforto. Que se enrijecem e se petrificam a ponto de paralisar a vida e a história. Todavia, no nível da comunidade de fé, os terceiros empregados são aqueles que, no ato de enterrar o talento recebido, não empenharam a vida para mais além do que aquilo que se é esperado; que não perseveraram ou não realizaram a vida através da entrega ao projeto de Deus em Jesus. Este terceiro servo pode ser inclusive aquele se diz fiel de carteirinha, mas que se acomodou no trivial; com o habitual; ou mesmo com o superficial da vida e da experiência de fé. É para isso que Jesus se serve desta parábola, de modo a alertar os seus para tal perigo.

A finalidade última é de caráter moral: exortar a comunidade a viver o presente com fidelidade e empenho. E, nesse sentido, a vigilância se torna mais uma vez necessária, e atinge, aqui, seu alto caráter de concretização. Ela consiste na operosidade fiel e incansável, que põe a frutificar a palavra de Jesus deixada como dom aos seus. Assim, a imagem dos talentos (somas grandiosas de ouro) converte-se na imagem dos dons que cada um recebeu de Deus.

A lógica do Reino dos Céus é esta: quem soube frutificar ao longo da vida o talento (os dons recebidos, e colocados no horizonte de Deus e de seu Reino), obterá ainda mais. Ao contrário, quem não soube lucrar os dons recebidos, na hora do juízo, ficará privado até mesmo do pouquinho que pensava possuir. E isto não é castigo divino, mas consequência da opção equivocada que fez.

Quem Somos diante da parábola deste trigésimo terceiro domingo do tempo do comum? O que temos feito do talento (dom gratuito) que Deus nos deu, de acordo com nossas próprias capacidades? Que imagens temos de Deus: a de um deus patrão e carrasco ou aquela verdadeira de um Pai que dá o todo necessário para poder frutificar a vida, crescer e ser mais?

 

Pe. João Paulo Góes Sillio.

Santuário São Judas Tadeu, Avaré/Arquidiocese de Botucatu-SP


sábado, 11 de novembro de 2023

XXXII DOMINGO DO TEMPO COMUM - Mt 25,1-13:

 


O capítulo vinte e cinco do evangelho de Mateus abre o quinto e último discurso de Jesus ao que compõe a sua catequese: o discurso escatológico, isto é, discurso final. Vale lembrar que o primeiro evangelho foi estruturado em cinco grandes ensinamentos, a exemplo da Torah, que contém os cinco primeiros livros da tradição de Israel. Este discurso é chamado de escatológico. O que significa esse termo? Literalmente, fim. É, portanto, uma reflexão acerca do fim definitivo das coisas, da realidade histórica, da pessoa. Mas entenda-se este “fim” enquanto meta, objetivo, realização plena.

Na perspectiva do Novo Testamento, as linguagens revestidas de temas escatológicos – o fim das coisas, dos tempos, da história - tem a finalidade de mostrar o destino, a meta e orientação última de tudo e todos que é Deus e seu projeto de vida alternativa, o Reino. Assim, a intenção do catequista bíblico, que assume esta linguagem, é a de chamar a atenção de sua comunidade para o modo de vida que ela deve assumir, ou seja, como ela deve viver, a fim de alcançar a meta final: Jesus e o projeto do Pai. Cristo é a ultimidade/novidade e plenitude da ação de Deus.

Mateus, inicia o capítulo com uma parábola contada pelo mestre. Sabe-se que as parábolas possuem três intenções: 1) servindo-se de elementos conhecidos da realidade, chamar a atenção do leitor-ouvinte, através da alteração ou do exagero destes elementos conhecidos, para 2) provocar os ouvintes; e, 3) estimulá-los a mudarem de atitude. Ao contrário do que muito se pensa, a vigilância não é o tema central, mas as atitudes dos discípulos. O convite à vigilância, que aparece no final do texto, servirá de gatilho para despertar o discípulo para suas atitudes. A parábola apresenta, uma vez mais, o contexto da festa de casamento. Mateus serve-se desta imagem preferida do profeta Oséias (e por toda a tradição profética do AT, e da concepção rabínica), na qual a imagem do esposo é aplicada à Deus. Ele seria o esposo e o povo, a esposa.

Jesus apresenta as personagens: dez virgens e o noivo. Interessante, não se sabe nada acerca da noiva. Ao narrar a parábola, ele opera mudanças significativas nos costumes da festa de casamento, precisamente para chamar a atenção. De acordo com o costume, era o noivo que ia ao encontro das virgens para acolher a sua esposa que era trazida por elas. Aqui, subverte-se a lógica e diz que são as virgens que correm ao encontro do noivo, que, aparentemente está atrasado. Mas, e a noiva, onde está? Pela lógica da parábola, já devia estar dentro da casa. Outra alteração é o fechamento das portas, após a entrada do noivo. Uma festa de casamento naquele contexto era um evento aberto para todo o povoado e esperado por todos. Quem são as dez virgens, das quais Jesus se serve para a parábola? Não se pode atribuir conotação moral-sexual ou biológica a estas personagens. Virgens eram aquelas moças que ainda não haviam se casados, nem tinham sido prometidas em casamento naquele contexto. Mas que estão à espera do noivo. Segundo Jesus, elas tomam suas lâmpadas e saem ao encontro do esposo.

Qual a característica destas jovens? Das dez virgens, cinco eram prudentes, e as outras, imprudentes. Jesus, no Sermão da Montanha (5,22) havia proibido o uso do termo morós (gr. μωραὶ/μωρός), o qual define uma pessoa tola, descrente, ímpia, pois tratava-se de uma ofensa muito grande que o discípulo não pode reproduzir. As outras cinco eram inteligentes, prudentes e sábias. Portanto, a chave de leitura para interpretar esta parábola é o texto do Sermão da Montanha, iniciado com as bem-aventuranças. Lá, o Senhor ensina ao discípulo o caminho para se cumprir a vontade do Pai: ouvir as Suas palavras e coloca-las em prática. Em Mt 7,21-24, na parábola do homem sábio que construiu sua casa sobre rocha aparece em contraste, o imprudente que construiu sua casa sobre a areia. Neste capítulo vinte e cinco, bem como em Mt 7, considera-se sábio quem tem a capacidade de realizar o querer de Deus; cooperar com seu projeto criador e gerador de vida.

As virgens sábias (prudentes, inteligentes), segundo a parábola de Jesus, trazem consigo mais azeite. Ao contrário das virgens tolas. Elas não se prepararam. Parece que a resposta dada pelas outras jovens soa egoísta ou insensível. Não podiam elas partilhar um pouco do azeite? Não! Porque o óleo é símbolo para as boas obras do ser humano. As boas obras, nesse sentido, são o óleo que não pode ser dado ou emprestado. É a parte que cada discípulo deve procurar fazer. É a resposta individual que cada um deve dar ao projeto do Reino, ao seguimento a Jesus. É aquela responsabilidade intransferível do “ouvir a Palavra e pô-la em prática” através das obras de justiça, as boas obras, cada um deve empenhar a vida nesse caminho.

O v.11 chama a nossa atenção. A cinco virgens tolas, ao voltarem com o óleo que saíram comprar, dão com as portas fechadas. De súbito, começam a chamar pelo noivo: “Senhor! Senhor! Abre-nos a porta”. Senhor é o título divino com o qual o judeu piedoso, terrivelmente religioso, se dirige à Deus. Soa como uma profissão de fé. A resposta contida no v.12 é muito importante: “Em verdade eu vos digo: Não vos conheço!” Ela está relacionada ao mesmo dito em Mt 7,22-23, “Não vos conheço. Afastai-vos de mim, vós, que praticais a iniquidade”. Jesus quer mostrar aos discípulos que não basta uma verdadeira convicção ou confissão de fé, se ela não se traduz na vida através da atitude de cumprir o querer e a vontade de Deus, mediante as boas obras. Nisto consiste a vigilância evangélica para a qual o Senhor nos convida a permanecermos e perseverarmos. 

“Portanto, ficai vigiando, pois não sabeis qual será o dia, nem a hora” (v.13). A vigilância bíblica não está ligada ao estar acordado, ou ao fato de não dormir. As dez jovens dormem. Mas ela indica uma atitude operativa. Ou seja, a capacidade de estar consciente de que se deve fazer algo. Logo, falta da vigilância indica a decisão de não fazer nada. Diante do texto, com quais personagens me identifico? Tenho mantido a lâmpada acesa? A lâmpada da nossa fé tem suficiente o óleo das obras boas?

 

Pe. João Paulo Góes Sillio.

Santuário São Judas Tadeu, Avaré/Arquidiocese de Botucatu-SP.