sábado, 14 de novembro de 2020

HOMILIA PARA O XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – Mt 25,14-30:


O evangelho deste trigésimo terceiro domingo do tempo comum segue na leitura e meditação do discurso escatológico de Mateus. Os capítulos 24 à 25 abarcam o último dos grandes discursos do evangelho segundo Mateus. Jesus, através desta catequese, dá instrução a seus discípulos a respeito da consumação da história e do destino da humanidade. O catequista bíblico recolheu este ensinamento do Senhor para a sua comunidade, visando oferecer as balizas para que o discípulo possa compreender como será julgado: a partir do modo como tratou, em suas necessidades, os irmãos mais fragilizados; frutificando a vida em boas obras..

Uma vez mais Jesus se serve do recurso das parábolas para ensinar seus discípulos. Conhecida como “dos talentos”, ela tem a intenção de ilustrar como a existência humana é o tempo oportuno e definitivo de fazer frutificar os dons recebidos de Deus e, assim, se preparar para o encontro com o Senhor. A parábola serve-se da realidade de um patrão que antes de sair de viagem confia a três de seus empregados uma soma de dinheiro. Note-se o seguinte: ele reuniu seus servos e confiou a cada um deles uma parte de seus bens. Ele não dá para reaver mais tarde; mas dá na gratuidade. É interessante, ainda, que Jesus mostra uma qualidade deste chefe: ele dá a cada um de seus empregados segundo suas capacidades. Ou seja, é alguém que conhece profundamente os seus. Sabe da capacidade que cada um possui.  

A um deu cinco talentos de ouro – unidade de medida da época. Cada talento equivalia a 34 quilos de Ouro. O primeiro recebeu o equivalente à 170 quilos de ouro. O segundo recebeu dois talentos – 68 quilos de ouro. Por fim, o terceiro recebeu um talento somente. Em seguida, o homem saiu de viagem. 

Os vv.16-17 narram a atitude dos dois primeiros, os quais conseguem lucrar cem por cento. O v.18, por sua vez, relata a atitude do terceiro empregado que decidiu-se por enterrar a quantia confiada a ele pelo patrão. Jesus realça o contraste existente entre os dois primeiros e este último: cem por cento contra zero de lucro.

Segundo a parábola, o dia do acerto chegou com a volta do patrão (v.21-23). O primeiro empregado apresentou-se com os seus talentos lucrados. De cinco talentos (170kg), devolveu ao patrão mais cinco (340kg). Foi elogiado pelo patrão, e recebendo a administração de muito mais, foi convidado a tomar parte da alegria do patrão. O segundo apresentou-se com mais dois talentos lucrados, dos dois que havia recebido (136kg); sendo elogiado pelo seu senhor, igualmente recebendo mais para frutificar e participando de sua alegria.

A quem se aplica a imagem dos dois servos que lucraram as somas recebidas? No tempo narrado, ou seja, no horizonte de Jesus e de sua missão, os dois servos são símbolos daqueles que aderiram ao Senhor e suas palavras, se tornaram discípulos e estão labutando no discipulado. Já no horizonte da comunidade de Mateus, os dois que participam do banquete escatológico já não são mais tratados como servos, mas os crentes comprometidos na fidelidade e que frutificaram em boas obras.

Por fim, chegou aquele que havia enterrado a soma de ouro que o patrão lhe concedeu cuidar. Ele veio logo se desculpando: “Senhor, sei que és um homem severo, pois colhes onde não plantaste e ceifas onde não semeaste. Por isso fiquei com medo e escondi o teu talento no chão. Aqui tens o que te pertence” (v.24-25). O patrão indignou-se com a postura do empregado, motivado por covardia, medo e acomodação. A sua postura frente ao terceiro empregado segue descrita pelo Jesus de Mateus, nos vv. 26-30. E será sobre ela que o relato parabólico se deterá. 

A personagem do terceiro empregado se aplica a quem? No horizonte da vida e da missão de Jesus, o terceiro servo é metáfora para as autoridades e chefes do povo, que através da atitude de enterrar a soma recebida, estão, na verdade recusando o projeto de Deus realizado por Jesus. A imagem é polissêmica – pode atingir vários significados. São certamente os observantes da lei que considerando ter cumprido, ponto por ponto, a vontade de Deus expressa nos mandamentos, e com isso se contentavam. E acabavam desconhecendo a exigência fundamental expressa na missão de Jesus. De fato, fechados na sua mentalidade mesquinha, rejeitaram o Messias, mostrando-se servos infiéis.

Todavia, no nível da comunidade de fé, os terceiros empregados são aqueles que, no ato de enterrar o talento recebido, não empenharam a vida para mais além do que aquilo que se é esperado; são aqueles que não perseveram ou não realizam a vida através da entrega ao projeto de Deus em Jesus, não frutificando nas boas obras. 

Aqui exige-se acurada atenção, pois pode-se conceber equivocadamente que o terceiro empregado possa ser aquele que não tenha aderido a Jesus e feito resistência a ele tão somente. Pelo contrário, este terceiro servo pode ser inclusive aquele se diz fiel de carteirinha, mas que se acomodou no trivial; com o habitual; ou mesmo com o superficial da vida e experiência de fé. É para isso que Jesus se serve desta parábola, de modo a alertar os seus para tal perigo. De igual modo, Mateus a transmite para a sua comunidade.

A finalidade última é de caráter moral; exortar a comunidade a viver o presente na fidelidade e com empenho. E, nesse sentido, a vigilância se torna mais uma vez necessária, e atinge, aqui, seu alto caráter de concretização. Ela consiste na operosidade fiel e incansável, que põe a frutificar a palavra de Jesus deixada como dom aos seus. A lógica do Reino dos Céus é esta: quem soube frutificar, ao longo da vida o talento (os dons recebidos e colocados no horizonte de Deus e de seu Reino), obterá ainda mais quando for julgado pelo Pai. Ao contrário, quem não soube fazer frutificar os dons recebidos, na hora do juízo, ficará privado até mesmo do pouquinho que pensava possuir.

Quem Somos diante da parábola deste trigésimo terceiro domingo do tempo do comum? O que temos feito do talento gratuito que Deus nos deu, de acordo com nossas próprias capacidades? Que imagens temos de Deus: a de um deus patrão e carrasco ou aquela verdadeira de um Pai que dá o todo necessário para poder frutificar a vida, crescer e ser mais. 

Pe. João Paulo Sillio.

Paróquia Sagrada Família/Arquidiocese de Botucatu-SP.

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