Celebra-se
em toda a Igreja a solenidade da Santíssima Trindade, ao interno do tempo
comum, já retomado após Pentecostes. No entanto, a liturgia ainda propõe a leitura
do Quarto Evangelho. A perícope oferecida é a que se encontra no capítulo dezesseis
do Evangelho segundo João. O presente texto, Jo 16,12-15, nos mergulhar na
solenidade de hoje.
O
capítulo dezesseis encontra-se, como já estamos familiarizados, na segunda parte
do evangelho joanino. Precisamente no chamado testamento de Jesus, a grande catequese-ensino
do Senhor que acontece ao redor da mesa, naquela ceia de despedida às vésperas da
páscoa judaica. Ao redor da mesa, Jesus revela o conteúdo do seu testamento, ou
seja, o dom da sua vida (simbolizado pelo gesto do Lava-pés, em Jo 13) e o
mandamento novo do amor, através do qual a comunidade dos discípulos se pautará
em viver, animada pelo Dom do Espírito. Continuando e atualizando a vida e a
missão de Jesus. E, para que a comunidade tenha a força para viver conforme Seu
modelo de vida promete, então, o Dom do Espírito.
O
texto proposto pela liturgia é retomado a partir do v.12. Jesus firma aos
discípulos sentados ao seu redor, na ceia: “Tenho ainda muitas coisas a
dizer-vos, mas não sois capazes de as compreender agora”. O Espírito será o intérprete
da vida de Jesus para a comunidade. Mas isso só será possível mediante o evento
de Sua morte-ressurreição. Pois será somente a partir da ressurreição que a
comunidade poderá reler a vida, missão, obra e ensinamento de Jesus, com
auxílio do Espírito. A ressurreição de Jesus e o Dom de Seu Espírito permitirão
à comunidade atualizar a vida e a presença do Senhor no meio deles. De fato,
seria impossível compreender as coisas antes que elas aconteçam.
Por
cinco vezes, durante o discurso, Jesus promete enviar o Espírito Santo quando
retornar para o mundo do Pai (cf. 14,16-17.26; 15,26; 16,7-8.13), de modo que
os discípulos não permanecerão sozinhos, pois através do Espírito, a presença
de Jesus se eternizará no meio deles. O Evangelho de hoje contém a quinta e
última promessa (CORNÉLIO, F, Homilia dominical, in porcausadeumcertoreino.blogspot.com).
O
Jesus joanino adjetiva o Seu Espírito como “Espírito da verdade”. Verdade no
evangelho joanino significa “amor/fidelidade”. Não se trata de uma verdade abstrata,
filosófica ou racional. A fidelidade/amor é o modo através do qual Jesus
decide-se por viver em relação ao Pai que é amor fiel, e em relação às pessoas.
Por isso, não se trata de uma verdade estática, mas dinâmica.
As
“coisas futuras” que serão anunciadas não são novas revelações ou visões;
significa a capacidade de ler os eventos futuros à luz da mensagem de Jesus. A
comunidade cristã – Igreja – sempre encontrará situações novas e surpreendentes
ao longo da história. Independente da época, deverá interpretar tais
circunstâncias à luz de tudo o que Jesus ensinou. Só é possível fazer isso
deixando-se conduzir pelo Espírito da Verdade (CORNÉLIO, F, Homilia dominical,
in porcausadeumcertoreino.blogspot.com).
Evidentemente,
não se trata da solenidade de Pentecoste, mas Jesus esclarece o que faz o Espírito:
“Ele me glorificará, porque
receberá do que é meu e vo-lo anunciará” (v. 14). O Espírito faz a comunidade
compreender que Jesus é vencedor. É o Espírito que agirá na ressurreição de
Jesus, tornando sua existência e vida em existência e vida salvíficas. Ele
atualiza na vida da comunidade a própria vida de Jesus.
O
eco trinitário que emerge do texto de hoje encontra-se no v.15: “Tudo o que o
Pai possui é meu. Por isso, disse que o que ele receberá e vos anunciará, é
meu”. Vê-se aqui o tema do amor (comunhão) e da unidade existentes entre Jesus
e o Pai. É sob o mistério da comunhão, amor e unidade que o Deus uno e trino pauta
o seu viver desde o interno de sua vida intra-divina. Esta vida, num mesmo mistério
de amor extrapola para fora da Trindade Santa e quem a revela é Jesus no
Espírito.
Da
vida da Trindade somos todos chamados a participar através do Batismo recebido,
o qual nos dá o Dom do Espírito, que habilita a chamar Deus de Pai e Jesus de
Senhor. Assim, o Espírito nos garante acesso a vida de Jesus e do Pai, porque
nos leva para dentro de sua relação de comunhão e amor, para vivermos segundo a
vida do mesmo Filho, inscrita em nós pelo Espírito. Ou seja, para vivermos uma
vida segundo o modelo da Trindade, em amor, comunhão e unidade.
Que
a vida da Santíssima Trindade, que já nos inhabita desde o Batismo, possa ser
vivida através de nossa existência e mediante o testemunho de fé da comunidade cristã,
a qual é espelho da comunidade perfeita formada pelo Pai, pelo Filho e pelo
Espírito Santo.
Pe.
João Paulo Sillio.
Arquidiocese
de Botucatu – SP.
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